sexta-feira, 6 de janeiro de 2012

PRA ME FAZER TE AMAR

Pra me fazer te amar terá de gostar de poesia. Não de poesia escrita ou falada, mas de poesia vivida:

Tem que se aproximar com verdade, sinceridade e ternura no olhar;

Tem que ter um caráter radicalmente ético e justo, pensar no social como uno, e que esta unidade começa em ti;

Tem que ter paixão e solidariedade por velhos, crianças, bichos e natureza. E que os olhos brilhem de admiração e respeito por isso;

Tem que ter humildade, querer saber sempre mais e melhor. Reconhecer que cada dia, hora, minuto é novo e que, portanto, nunca estamos prontos, formados ou preparados;

Tem que querer conhecer outras línguas e culturas, e aprender da diferença a tolerância, do alter o igual, do trânsito a identidade. E entender que a vida é mais dinâmica do que o calendário faz parecer;

Tem que sentir atração pelos mistérios da vida, sentir o transcendente em cada detalhe simbólico, e chamar isso de Deus;

Tem que gostar de preguiça, de ouvir chuva, de canto de pássaro ou mesmo de grilo, e de ler um livro;

Tem que apreciar os domingos em família e com os amigos. E entender o valor e a importância destes momentos pacatos, divertidos e relaxantes para oxigenar uma semana corrida;

Tem que buscar a simplicidade. Sonhar grande e alto sem deixar de valorizar o ínfimo;

Tem que gostar de olho no olho, de mão na mão, coração no coração, respiração na respiração;

Tem que demonstrar atenção e carinho, seja no toque da pele ou no do celular;

Tem que se inquietar com o ininteligível e, por isso gostar de metafísica e filosofia;

Tem que ter sensibilidade em perceber a hora de falar, de calar ou de ouvir, de estar presente ou se ausentar, de ficar ou de fugir;

Tem que ter abertura e entrega para a dança, seja na chuva, no vento, no salão ou no pensamento. O importante é saber se permitir ser tomado pela musicalidade da vida;

Tem que gostar de diálogo, de entendimento maturo. E ter suavidade nisso.

Tem que gostar de trocar riso fácil: seja pela piada, pela flatulência, o filme besteirol, a cueca vestida às pressas ao avesso, ou o chulé do dia cansado;

Tem que gostar de ser humano, e buscar o divino disso;

Tem que ser companheiro e cúmplice, achar o mau hálito pela manhã romântico, entender que é normal ter remela no olho quando acorda, ter catarro com gripe, a mulher ter espinha quando menstruada, e achar tudo fofo por saber que a vida cotidiana tem seus rituais de passagem;

Tem que ter um sonho, uma meta, um objetivo. E ter garra, coragem e determinação para se focar neste projeto. E querer dividir isso, querer ter alguém para somar força, esforços e reforços para a construção do mesmo. E gostar do olhar orgulhoso do outro como partícipe em cada etapa conquistada;

Tem que, enfim, gostar de se sentir vivo e viver como uma oração aberta agradecendo respirante e intensamente cada oportunidade, cada pulso, cada gesto, cada amanhecer, anoitecer, florescer, cada um de todos os verbos diários que se abrem para que os façamos carne.


A criação continua em nós. Carregamos no gene e na história o potencial ilimitado para a possibilidade. Para me fazer te amar, tem que entender, ou ao menos aceitar, a dimensão INFINITA de tudo o que acabou de ser lido.

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