quinta-feira, 19 de maio de 2011

Cisma

Madrugada. Grilhos. Frio. Vazio.
Empty, empty, empty...
Empilhados ecos deste silêncio vacilante...

Vida meio morta, metade, meia-vida
Vastidão desterritorializada e ambígua
Nadas elevados à potências de outros nadas: eu.
Música tenebrosa, mistérios do breu.

Passa tudo quanto passa
Versa tudo quanto cala
Cala tudo quanto chora:
Lágrima que inunda dentro e fora...

Escárnio do tempo,
Vou sem nexo ao encontro de ninguém
Meu entendimento é o não ter entendimento
Cega. Meu horizonte é nada.
Como uma total ausência de poesia.

Castigam-me minhas células
E a areia escorre: nas águas, na ampulheta
Desfile sem cor de abismos bossais
Vultos insossos desta pausa mórbida
Cala. Vaga. Saga...

Ah! Como estou farta destas presenças-ausentes!
E destas ausências-presentes!
O tempo da saudade me adotou por intérprete
Vivo à sombra da impossibilidade
Darkness, darkness! No anwsers me invade!

Aonde hei de parar nesta desmesura?
Quantas vidas terei de sacrificar?
Eu, cordeiro de mim, não páro de me sangrar!
Quantas escolhas erradas!
Oferta despojada e despejada na garganta aberta do nada!
Eloi, Eloi, lama sabactani?
Queres que eu faço reviver o que vivo-morto está
Mas e eu? Substraio-o...
Quantas vidas queres que eu recrie?
Ao passo que reinvento aos demais
Vou apagando, borrando, encobrindo meus passos atrás
E quando volto minha cabeça só vejo lentamente sumirem minhas pegadas...

Cheiro de inércia pairando no ar
Como uma ferida que nunca sana, que nunca estanca
Como uma terra sempre na lama
Como lutar uma guerra que nunca finda
Como ter asas que nunca hão de voar...

Odor daquilo que acaba sem começar!
Impossibilidades impostas, algemada vou
Aguentando o odor desta carne inatitude
Vou castrada... sem sexo, sem sonho, sem nada!
Odor de nada, de não-ação! de nulidade!
Fragância incômoda desta câimbra nada, nada e nunca sái da praia
Rasa. Sensação rasa...
E quão profunda eu poderia estar!

Mas para que afinal conhecermos o infinito se nunca se pode alcançá-lo?
O tempo, a ideia, as grades, as vozes congeladas no gene
A possibilidade sempre sibilando estanque
Notas maquinais, melancólicas e repetitivas
Como o incômodo silêncio de um sertão na seca
Retirante! Apreai-vos! Desperta com o despertar!

Matéria, sórdida matéria!
Como transpor obstáculos sozinha?
Ainda que tão forte, intensa e escandalosa a vontade de gritar... me calo
Por proteção. Já me assustei de mim. É sério!
Ao deparar-me só e notar que somente minha voz me responde...
É deveras horripilante a sensação
Arrepia a espinha e o espírito!
Vazio sobre vazio sobre vazio...
Dimensões intáteis que o cérebro nunca alcança...

Quisera eu como a urubórus engolir-me a mim
Quisera vomitar para dentro e fora de mim uma nova era...

Mas sem pés vou disforme pela rua deserta
Antropodesmerecendo-me...
Quando estamos caindo só vemos olhos sem mãos
Punhos cerrados de não conhecer o tato
Cativos de si, amedrontados
Como intencionar a mão de um corpo sem coração?

E ao sabor da queda, minha cabeça rodopia na noite
Chão que nunca chega
Azia, tontura, tortura, vertigem, anestesia!
Paisagens grises e cada vez mais pálidas...

Ah! Meu doce coração! Te aquietes por favor!
Não vês que cair para fora é cilada?
Não vá na onda deste destino maquiavélico!

A solução é cair para dentro de mim
Vai coração! Mergulha no profundo de minh'alma
Seguro que encontrarás algo de bom
Não em minha frágil matéria
Se hospede longe dela, não confies nela!
Pois ela é ingênua, amora e gentil
Está sempre sorridente, solícita e oscilante!
Fácil chamariz dos ímãs de gentis energias
Não vá por aí! Atenção!
Apesar de confortável, também é lugar sem chão!
Caia sim para dentro de meu espírito
Nele algo de ininteligível flamejante e vivo te acolherá
Suaveza de estrelas e córregos
Ali te fertilizarás... Transcenderás.

Aposenta-te ali e promete-me que serás ágil e fiel transeunte
Que me atualizarás das verdades dali
E que toda vez que regresses me farás ver
As improbabilidades do belo que almejo
E que há de permanecer inócuo no mistério
Dos dias cármicos que desfilam minha vida...

Ahh Moiras! Aliviai-me! Trégua! Estou cansada!

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