domingo, 20 de novembro de 2011

Destemperança

Vivo num tempo sem tempo
Sem o caminho do meio
Um tempo feito de passado e de futuro,
Portanto, sem futuro.

Um tempo de gente, humana.
Um tempo de anjos, divina.

A linha de minha idade não pode ser medida pelo presente
Metáfora instável e variável carregada de nadas.

Eu vivo no tempo dos poetas: um tempo sonhado.
Um tempo que se realiza no imaginado
Um tempo dos românticos, ultra-passado, inabitado.

De sóis e outonos vive este meu inverno
De mentira passageira acreditada
Mentira que faz viver
Dose diária de oxigênio às minhas células gastas.

Vivo o tempo dos desabitados,
Gente que carrega no olhar a marca do peito fragmentado
Vazio de amor incurável, aquele nunca alcançável.

Vivo no tempo do sonho
Onde não existem barreiras para os demais tempos
Quando verdadeiramente se quer,
Fecha-se os olhos e as passagens se abrem
Tudo é mutável e possível
Tudo se dilui ante à força maior.

Tempo de gente dilacerada,
Plasmada em tudo.

Tempo de gente que espera
E mesmo quando mente a si mesmo que não espera
O pulso segue esperando...
Tic-tac d'uma desgovernada bússula
Essencial ao movimento do barco...

Tempo de mar: ora revolto, ora calmo
Ora manso aberto e alargado sobre o céu das possibilidades
Ora gritante como uma tempestade.

Tempo destemporal, descomunal, insosso
Vago de vertigem e fosco
Inodoro, inconstante, insípido
Tempo desencontrado dos ante-confessos conhecidos.

Lua desta noite amarga de vida
Dize-me se é possível, ainda que pouco provável,
Que o presente se faça presente?

O céu é lindo...
Brilham as estrelas em sua natural soberania:
Vagas, serenas, tranquilas.

Tudo é mansidão na imensidão dos dias
E o mundo cala em poesia...

E cá embaixo eu: ínfima.
Tão pequena e curta quanto esta esperança.

Já me acostumei ao meu des-ser
Aqui já não há subida
Des-espero. Des-fico. Des-vou.

Sobrei, e sóbria estou
Aguentando o peso desta des-vida.

...Há mais mortes na dor do que supõe nossa vã anestesia.

Nenhum comentário:

Postar um comentário